Pesquisadores do USP, Unicamp (incluindo cientistas do CQMED) e da Universidade de Sucre (Colombia) publicaram novo estudo na revista Current Research in Structural Biology sobre a estrutura da proteína PknF, essencial no metabolismo do bacilo causador da tuberculose, a Mycobacterium tuberculosis. Bloquear a atividade desta proteína pode ser uma forma de conter o desenvolvimento da bactéria no hospedeiro. 

Com a estrutura da proteína decifrada na pesquisa, foi possível identificar regiões que são essenciais para a atividade metabólica da bactéria em nível molecular. A partir desse conhecimento, é possível buscar compostos já existentes que possam tratar a tuberculose ou desenvolver um novo composto que se ligue à proteína de forma a impedir a sua atividade, abrindo caminho para desenvolvimento de novos fármacos para a doença.

Conversamos com a Andrea Balan, pesquisadora do Laboratório de Biologia Estrutural (LBEA), do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP), e autora correspondente do artigo, sobre detalhes da pesquisa, suas aplicações e próximas etapas a serem realizadas. Confira a entrevista:

O trabalho resolveu a estrutura da proteína PknF. Como o conhecimento dessa estrutura pode ajudar no desenvolvimento de novas drogas para a tuberculose?

Resolver a estrutura de uma proteína permite o entendimento de como a proteína é na sua forma e como pode realizar a sua função na célula. Conseguimos identificar regiões que são essenciais para a atividade da proteína em nível molecular e então podemos buscar fármacos já existentes, novos compostos ou desenhar um composto que se ligue à proteína de forma a impedir a sua atividade. A PknF é uma proteína importante no metabolismo do bacilo causador da tuberculose, o Mycobacterium tuberculosis, principalmente quando o microrganismo infecta macrófagos humanos. Bloquear a atividade desta proteína pode ser uma forma de conter o desenvolvimento do bacilo no hospedeiro.  

De que forma você diria que o estudo impacta a ciência na área da biologia estrutural?

Em termos de enovelamento, ou forma da proteína, a PknF não é muito diferente de outras proteínas do mesmo tipo e não chega a ser impactante, porém, a forma como ela interage com outras proteínas na célula e promove mudanças de comportamento do microrganismo é impactante. Nosso trabalho mostra que a ação da PknF em uma outra proteína muito importante do Mycobacterium tuberculosis, muda a forma desta proteína e altera a membrana celular.

Quais métodos foram utilizados? Pode explicá-los brevemente?

Utilizamos uma abordagem multidisciplinar. Primeiramente, produzimos a PknF e a proteína que é seu  substrato em larga escala, em células bacterianas (Escherichia coli, bactéria usada como “fábrica” de proteínas). Purificamos as proteínas por técnicas cromatográficas e as submetemos a diferentes ensaios. Foram usadas as técnicas de cristalografia de proteínas (permite a caracterização da estrutura em nível atômico), espalhamento de raios-X a baixo ângulo (SAXS), que permite avaliar a proteína em movimento. Esta técnica foi usada para entender como o encontro da proteína com seu substrato alterou a forma do mesmo. Ainda, utilizamos calorimetria (técnica que permite avaliar a afinidade da proteína pelo substrato), fluorescência e outros métodos biofísicos para avaliar mudanças conformacionais na PknF e no substrato. Também usamos técnicas de biologia molecular para fazer mutantes.

Há próximos passos previstos para a pesquisa? Quais?

Sim, resolvemos apenas uma parte da PknF que fica no citoplasma da célula, mas esta proteína tem uma parte que fica fora da célula e que acreditamos ser um sensor das condições fisiológicas do ambiente. Este sensor que diz para a PknF se ela deve ou não ser ativada. Queremos resolver a sua estrutura e identificar quais são as moléculas ou condições celulares que ativam esse sensor. Acreditamos que desenvolver inibidores para o sensor, pode ser uma nova estratégia de contenção do microrganismo. Também queremos resolver a estrutura do substrato da PknF, que é um complexo proteico embebido na membrana do bacilo.